terça-feira, 13 de novembro de 2012

Mostre as algemas, Zé Dirceu!

Condenado, sem passaporte e prestes a ser sentenciado a uma das mais duras penas da história judicial brasileira, José Dirceu não tem alternativa a não ser exibir, com orgulho, as algemas preparadas por Joaquim Barbosa, assim como fez quando foi preso pelo regime militar; leia o texto inédito do poeta Lula Miranda, exclusivo para o 247.
Foi o que teria dito a José Dirceu, em Setembro de 1969, um dos presos políticos naquele histórico momento de resistência à ditadura militar em que 15 prisioneiros do regime de exceção e arbítrio, que se instaurara no Brasil, foram libertados em troca do embaixador americano – na fotografia aparecem 13, apenas uma mulher.

Exceção e arbítrio. Palavras malditas. Palavras-emblema de tempos sombrios.
Segundo relato de Flavio Tavares, hoje jornalista e escritor, ele teria sussurrado aos companheiros na ocasião: “Vamos mostrar as algemas”. Fez isso num insight “de momento” ao notar que os presos que estavam ali perfilados, alguns agachados, como um time de futebol campeão, numa forçada pose para uma foto que viria a se tornar histórica, escondiam as algemas. E por que escondiam as algemas aqueles jovens? Talvez por vergonha. Talvez porque estivessem preocupados em como aquela imagem poderia machucar ainda mais seus familiares e parentes mais próximos. Ou talvez, simplesmente, porque já estavam por demais combalidos e abalados moral e emocionalmente para se preocuparem com aquele peculiar adereço do arbítrio. Não se sabe ao certo, tampouco importa. Mas, insistiu Tavares, naquele “insight” que, ao contrário,em vez de esconder, as exibisse.

Mostre as algemas, Zé! Exorto-lhe nos dias que correm hoje. Dias de incipiente e vilipendiada democracia.
Na foto, podem verificar, percebe-se nitidamente o Zé Dirceu exibindo, intrépido, as malditas algemas.

Eu que não fui amigo daquele jovem idealista algemado de outrora, tampouco conheci o suposto homem “todo-poderoso” do governo; logo eu que o combati na disputa política, até com palavras duras, eu que nunca o vi mais magro, ouso lhe fazer a mesma súplica: Mostre as algemas, José Dirceu!
Não tenha vergonha de nada; tenha orgulho. Você ainda será, por vias transversas, um preso político. Sim, orgulho! Em que pese a maledicência covarde daqueles que, assim como naqueles dias sombrios de 1969, hoje lhe apontam o dedo, xingam e condenam. São os mesmos – “imortais”, “eternos” porta-bandeiras da (falsa?) moral. Ora se são!

Mostre as algemas, Zé!
Exiba a todos, daqui e para o resto do mundo! Mostre a todos o que se faz aqui no Brasil a homens como você, que prestaram valorosos serviços à pátria; que lutaram com destemor pela ditadura; que ajudaram a eleger o Lula; que empenharam a sua vida e juventude no afã de mudar um pouco a feia face desse país tão injusto com seus filhos, ajudando a implantar políticas públicas que tiraram milhões da miséria e do desalento.

Mostre a p* dessas algemas, cara! Para o bem e para o mal. Para o orgulho dos amigos e regozijo dos inimigos.
Confesso que esperava que o julgamento do STF fosse “emblemático”, justo. Não “justo” pelo mesmo metro, critério ou “premissas” com que a imprensa insuflou e ensandeceu as galerias. Mas justo “de verdade”: que fossem condenados os culpados, aqueles que tivessem suas culpas efetivamente comprovadas. Sim, que fosse uma firme sinalização rumo ao fim da impunidade no Brasil. Mas não foi isso exatamente o que se viu. Não foi isso que testemunhamos. Houve erro e exagero. Do Supremo. Da mídia grande em geral. Uma caricatura. Entre erros e acertos, a injustiça foi soberana.

Os ministros demonstraram-se, desgraçadamente, um tanto tíbios, vaidosos e suscetíveis à pressão e clamor da turba, de modo irresponsável manipulada e insuflada pela opinião publicada. 

Você foi condenado sem provas. Isso é fato, irretorquível. Foi condenado sem provas, repito. Foi condenado com base em suposições e suspeitas, com bases em capciosos “artifícios” jurídicos, tais como a hoje célebre “teoria do domínio do fato”. Uma excrescência, uma espécie de “licença poética” do golpismo – com o perdão dos poetas, por aqui aproximar as palavras “poética” e “golpismo”.
Eu poderia “achar” que você era culpado. O meu vizinho poderia achar que você era culpado. O taxista poderia achar. Todo mundo poderia “achar” que Zé Dirceu era culpado. Mas um juiz, seja do Supremo ou de 1ª instância, não pode, em absoluto, “achar” que você ou qualquer outro é culpado. Isso é uma ignomínia – como você tem se cansado de dizer, reiteradas vezes, em suas manifestações. Não nos cansemos de, indignados, exclamar: uma excrescência, uma ignomínia!

Zé, mostre as algemas! Elas são o espúrio troféu que lhe ofertam os verdugos!
Nunca pensei em sair do meu país, Zé, agora já penso com carinho e desconforto nessa possibilidade. Como posso viver num país em que minhas garantias fundamentais de cidadão não são respeitadas?!
Que país é esse?! Que Justiça é essa?!
Quebrou-se a pedra fundamental de toda nossa estruturação jurídica: a presunção da inocência. Em seu lugar colocaram a presunção da culpa. Parece piada, de mau gosto, decerto, mas não é. Como já disse antes, repito: não se é permitido fazer graça com a desgraça alheia. E sua vida foi desgraçada, Zé.

Mostre as algemas!
Veja bem, se você – insisto, reitero – um homem que tantos serviços prestou ao país, um homem respeitado por intelectuais, políticos e autoridades do mundo todo foi enxovalhado dessa maneira, submetido à execração pública pela mídia. Desonrado, chamado de “quadrilheiro”, “mensaleiro”, “ladrão”, o que fariam com um “poeta marginal” como eu? Um homem qualquer, sem galardão algum, sem cânone, sem mérito. Parafraseando certa atriz de cenho angelical, “namoradinha” desse mesmo Brasil: tenho medo.
Não sei que monstro o STF e a grande imprensa estão ajudando a criar. Mas uma coisa eu lhe asseguro: é assustador.

Para aqueles que, sem questionar, acham justa a sua condenação e prisão eu pergunto; para os “inocentes úteis” que aceitam sem titubear esses consensos forjados e essas verdades absolutas que a grande mídia sopra, todos os dias, em nossas consciências nos telejornais e nas manchetes dos jornais estampadas nas bancas; faço-lhes a pergunta que não quer calar: por que criminalizam e prendem somente os petistas e mais alguns “mequetrefes” da chamada “base aliada” do governo Lula? 

Por que essas práticas de sempre na política, hipocrisia à parte, agora “ilícitas” e “criminosas”, só são permitidas aos “de sempre”? Por que os sessenta e tantos investigados no chamado “mensalão mineiro” [não é tucano?!] não foram acusados/denunciados? E não serão jamais – pois para estes o crime é eleitoral; é caixa 2, já prescreveu [“Dois pesos, dois mensalões” – by Jânio de Fritas]. Já quando são petistas os agentes da ação… é corrupção; é “golpe”; são “práticas espúrias”, “criminosas” de um partido, digo de uma “quadrilha”, em “sua sanha de se perpetuar ad eternum no poder”. Não, essas palavras não vieram da tribuna do Senado ou da Câmara dos Deputados, não saíram da boca de algum político da oposição, mas – pasmem! – foram proferidas por ministros do Supremo. Por ministros do Supremo, repito! Juízes na Ação Penal nº 470. Vejam a que ponto chegamos!!!

Mostre as algemas, Zé! Mostre as algemas!
Essas tais “práticas ilícitas” ou “criminosas” não deviam ser permitidas a ninguém – não é mesmo? A Justiça não deveria ser igual para todos?!
Qual a resposta a esse singelo por quê?
Por que só os petistas são condenados, execrados e presos? 

A resposta também é simples: para que o poder permaneça nas mãos dos “de sempre”, nas mãos dos eternos “donos do poder”. As chamadas “regras do jogo”, até as bastardas, servem apenas para a parte podre das nossas elites; quando é para os “do lado de cá” aí deixa de ser “regra do jogo”, passa a ser crime; “práticas espúrias”; “compra de voto”.

Faço um singelo convite a todos: vamos pensar o país, no qual a gente vive, um pouco além da hipocrisia, do partidarismo, do “falso moralismo” e dos “manchetismos grandiloquentes” de uma imprensa que serve aos interesses de determinada classe social e ideologia. Mais temperança e equilíbrio aos juízes Supremos e nem tão supremos assim, o chamado “cidadão comum”.
Não podemos nos dobrar a esse estado de coisas. Não podemos nos calar e assim sermos cúmplices e testemunhos silentes dos erros dos tribunais. Repito: o Supremo exagerou; a mídia exagerou. 

Quadrilha?! Onde? Compra de votos?! Penas de reclusão superiores a 30 anos! Há aí um nítido erro na tipificação dos crimes, nas condenações e exagero na dosimetria das penas. O que é uma pena. Pois isso poderá até favorecer aos condenados, pois essas condenações injustas e essas penas exageradas certamente serão revistas algum dia, por esse ou por outro tribunal. Espero, sinceramente, que sejam revistas por esse mesmo colegiado, pois ali também estão homens de valor. E que essa vergonha, esse grave equívoco não se perpetue.

Nesse momento, só me resta dizer…
Mostre, com orgulho, as algemas, José Dirceu!
*Lula Miranda é poeta, cronista e Economista. Foi um dos nomes da poesia marginal na Bahia na década de 1980. Publica artigos em veículos da chamada imprensa alternativa, tais como Carta Maior, Caros Amigos, Observatório da Imprensa, Fazendo Média e blogs de esquerda.

Lula Miranda é poeta, cronista e Economista. Foi um dos nomes da poesia marginal na Bahia na década de 1980. Publica artigos em veículos da chamada imprensa alternativa, tais como Carta Maior, Caros Amigos, Observatório da Imprensa, Fazendo Média e blogs de esquerda.

Fonte: http://www.esmaelmorais.com.br

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

UMA HISTÓRIA RICA DE ORGANIZAÇÃO POPULAR EM COREAÚ

Acentuadamente a partir da década de 80, houve em Coreaú uma efervescência progressista, encabeçada, sobretudo, por agricultores, que culminaria na fundação de algumas instituições de importantíssimo papel no processo de discussão e de organização local popular.

Os primeiros traços se encontram nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), fundamentadas da Teologia da Libertação, com seus líderes formados no seio do Movimento Dia do Senhor, da Diocese de Sobral – onde se pretendia propiciar a formação crítica de lideranças camponesas, a partir da problematização da realidade à luz da Bíblia. Tratava-se de um esforço em formar leigos atuantes nas comunidades, promovendo sua organização em prol da luta por direitos.

Ensejada pela discussão das CEBs, houve a fundação de várias associações comunitárias, e de uma central, a ADEC (Associação Desenvolvimento Comunitário de Coreaú), sediada então onde fica atualmente o Salão Paroquial, até meados da década de 90, quando foi destituída do prédio pelo pároco recém-chegado. Tal prédio teria sido construído a partir de uma cooperação Alemanha-Brasil, para servir à comunidade enquanto espaço de reunião, celebração, formação e organização comunitária.

Na ADEC estão fincados os ramos que constituiriam a organização da Fundação CIS, da Sede de Coreaú, e, muito posteriormente, da AEDI de Araquém, assim como também estabelece ligação com a ADECUBA, de Ubaúna, e várias outras instituições. Doravante, neste blogue, teceremos mais comentários acerca dessa história popular... 

Fonte: Blog do Ditim

Comissão da Verdade vai discutir atuação de igrejas durante a ditadura


A Comissão Nacional da Verdade criou um grupo de trabalho para analisar o papel das igrejas Católica e evangélicas durante o regime militar (1964-1985). A primeira reunião será na quinta-feira 8 em São Paulo. O grupo pretende aprofundar as discussões sobre a atuação que as igrejas e os religiosos tiveram tanto na resistência ao regime militar quanto na colaboração com a repressão.


O trabalho do grupo será todo desenvolvido com a assessoria de pesquisadores autônomos e da sociedade civil especializados em ciências da religião, história e sociologia. No primeiro encontro, eles apresentarão os temas de pesquisa e farão o planejamento da agenda de trabalho para os próximos meses. A coordenação dos trabalhos é do professor Paulo Sérgio Pinheiro, membro da comissão.

Na próxima semana, entre os dias 16 e 18, a Comissão Nacional da Verdade terá atividades no interior do Pará para averiguar questões referentes à Guerrilha do Araguaia, ocorrida no período de 1960 a 1970. Um dos temas será a análise sobre a atuação na guerrilha da etnia Suruí, que atualmente vive na Terra Indígena Sororó. Há controvérsias sobre o assunto apesar de existir informações sobre a exploração de indígenas desse grupo pelos militares.

Fonte: Revista Carta Capital

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